Hosana ao Sesquicentenário de

Após o letargo em que mergulharam as inteligências por longos séculos, proibidas pela intolerância clerical de raciocinar em torno da realidade da Vida e das legítimas aspirações do ser humano, espocaram as reações do pensamento filosófico e da experimentação científica, a pouco e pouco vencendo as lamentáveis imposições arbitrárias e abrindo campo a novas conquistas libertadoras.

Desalgemadas da tirania a que estiveram submetidas, conseguiram penetrar nas incógnitas existenciais, decifrando-as com a contribuição da lógica e da razão, ao tempo em que as demonstrações laboratoriais confirmavam-lhes as conquistas exuberantes.

As possibilidades de aprofundamento das sondas da investigação nos variados campos do conhecimento ensejaram-lhes ampliação de entendimento sobre o macro e o microcosmo, desvelando realidades jamais imaginadas, graças às quais o progresso passou a multiplicar-se pelas próprias conquistas, e não mais lentamente sob as ameaças perversas.

Sucede, porém, que esse fenômeno é resultado da força da vida que não permite seja impedido de maneira permanente o desenvolvimento intelecto-moral do espírito humano, e toda vez quando este se vê ameaçado, mais vitalidade adquire para superar os empecilhos, trabalhando pela liberdade de pensamento, de expressão e de ação.

Era natural, no entanto, que ao lado das incontáveis aquisições científicas e tecnológicas, dos avanços culturais e descobrimentos de toda ordem, surgissem as reações da mágoa, as necessidades de desforços, as agressões a instituições e lideranças caducas, assinalando o momento com pessimismo e amargura.

O materialismo que se instalou soberano nas academias, agora livres do imperialismo cruel das religiões ultramontanas, comandando os seus aficionados, ergueu-se, tão arrogante quanto as crenças espiritualistas que o antecederam, travando inglórias batalhas de resultados nefastos para a cultura.

Homens e mulheres notáveis engalfinharam-se em contendas injustificadas, enquanto cientistas respeitáveis deixaram-se dominar pela necessidade de junto aos pensadores exterminar Deus e a fé religiosa nas mentes e nos corações humanos, dando lugar a um grande vazio existencial.
O materialismo é uma chaga no sentimento da criatura, porque lhe retira toda a esperança de felicidade e de consolação após as acerbas dores da existência física. Anula a alegria de viver ante as vicissitudes e os testemunhos inevitáveis em todas as experiências humanas da evolução. Perturba a mente e tortura o sentimento, empurrando o homem e a mulher para o suicídio quando os recursos imediatos não podem resolver as ocorrências angustiantes, as enfermidades irreversíveis, os dissabores morais, os sofrimentos espirituais...

Logo se espalhou uma onda de descrença em tudo, inclusive, no próprio ser humano, estabelecendo-se paradigmas utilitaristas e imediatistas para a conquista do prazer e da felicidade, enquanto utopias variadas convidavam ao existencialismo e à libertinagem, como mecanismos de fuga da fragilidade orgânica e da temporalidade do corpo.

Por outro lado, a precipitação de alguns cientistas elaborou teorias fantasistas para explicar a vida e o ser, antes de comprovação laboratorial que lhes servisse de fundamento para aquisição de valor.

Escolas de pensamento multiplicaram-se com e sem ética, procurando umas sobrepor-se às outras, em aguerridos combates culturais nem sempre sustentados pelo bom senso e pelo altruísmo dos seus defensores.

Teses formidandas surgiram da noite para o dia procurando explicar tudo, inclusive o que nunca fora examinado, assim tudo reduzindo praticamente ao nada, em orgia de liberdade intelectual, prejudicando a respeitabilidade do bom-tom e da razão.

A euforia abriu portas a descalabros culturais e comportamentais muito graves, tão prejudiciais quanto as proibições anteriores e as suas perseguições insanas. Embora as luzes da cultura se expandissem, permaneceram muitas sombras e novos dogmas foram estabelecidos pelos magister dixit, substituindo aqueles que foram ultrapassados...

A deusa razão, que fora entronizada em Notre Dame, por exemplo, no fim do século XVIII, cedeu lugar ao anarquismo e simultaneamente ao autoritarismo de alguns cientistas e pensadores do século XIX, mantendo o aturdimento nas massas humanas nos seus diferentes segmentos sociais, nem sempre esclarecidas e bem-orientadas.

Foi nesse báratro que surgiu O Livro dos Espíritos, apresentado por Allan Kardec, no dia 18 de abril de 1857, como débil claridade na imensidão das sombras...

Possuidor de incomparáveis tesouros de lógica e de ética, de conhecimentos e de informações que vieram dos Espíritos imortais, novas proposições fizeram-se conhecidas, esclarecendo dúvidas e interrogações inquietadoras, fundamentando sempre os seus argumentos nas conquistas realizadas pela ciência de então, com lucidez para enfrentar as suas futuras aquisições de forma sempre atual e renovadora.

Antecipando Charles Darwin, Allan Kardec apresentou o evolucionismo vinculado ao criacionismo, única forma de compreender-se o processo antropossociopsicológico do ser humano, dando-lhe dignidade e objetivo existencial.

Estabelecendo paradigmas de alta magnitude, libertou Deus do antropomorfismo em que O encarceraram através dos milênios, explicando de forma profunda o que são o espírito e a matéria, a criação, a morte e a reencarnação, a justiça divina, os processos de interferência espiritual na conduta humana, as leis morais da vida, as esperanças e as consolações.

Examinou a moral sob o ponto de vista dos imortais, oferecendo luz à ciência, e antecipando-a em muitas explicações, porque, enquanto a mesma estuda os efeitos, o Espiritismo remonta às causas de todas as ocorrências, dando-lhes sentido lógico e ético, fundamentando os seus postulados no amor de Deus, Causa Primeira de todas as coisas.

À medida que foi examinado, conhecido e divulgado, tornou-se modelo de doutrina científica, filosófica e moral de conseqüências religiosas, em razão dos paradigmas que estatui, apresentando o Espiritismo como uma ciência que estuda a origem, a natureza, o destino dos Espíritos e as relações que existem entre o mundo corporal e o mundo espiritual. Ciência sui generis, porque não se utiliza dos elementos convencionais que são examinados pelas outras, mas estuda o ser humano em sua estrutura íntima, como princípio inteligente do Universo, acompanhando-o após a disjunção molecular, pelo fenômeno da morte biológica.

Ao mesmo tempo, oferece uma filosofia comportamental rica de bênçãos, nos seus conteúdos ético-morais, que culminam com a crença em Deus, na imortalidade da alma, nas comunicações dos Espíritos, na pluralidade dos mundos habitados, firmada nos postulados ensinados e vividos por Jesus e pelos Seus primeiros discípulos...

Utilizando-se da mediunidade, o preclaro Codificador demonstrou à saciedade a sobrevivência do Espírito à desencarnação, assim como as multifárias experiências reencarnatórias que lhe são facultadas, a fim de alcançar a perfeição relativa que lhe está destinada.

Graças a esse processo de evolução ficaram explicadas, desde então, as razões do sofrimento, dos destinos, das aspirações e das ocorrências felizes ou desditosas que assinalam incontáveis existências corporais.

Proporcionou a visão otimista em torno da jornada terrestre, assinalando que a responsabilidade pelo progresso ou o estacionamento na via de crescimento intelecto-moral é de cada um, que desfruta da oportunidade de desenvolver as aptidões que lhe dormem inatas, heranças que são da Divindade, ínsitas em todos.

Desfez a mitologia a respeito dos divinos castigos e das eternas punições, assim como das benesses celestiais concedidas a passe de mágica, distantes da justiça e do amor irrefragável do Criador que vive no Cosmo.

Antecipou o conhecimento em torno da consciência humana, explicando que nela se encontra gravada a lei de Deus, do que resultam as alegrias existenciais, os conflitos e as culpas, os procedimentos geradores da felicidade e do desar.

Obra monolítica, desdobrou-se nos incomparáveis O Livro dos Médiuns, O Evangelho segundo o Espiritismo, O Céu e o Inferno e A Gênese, abrangendo o conhecimento universal e mantendo vinculação com as mais diversas ciências como a Antropologia e a Psicologia, a Fisiologia e a Psiquiatria, a Química e a Física, a Biologia e a Astronomia, o Direito e as Artes...

Nestes dias, quando o conhecimento atingiu patamares jamais supostos de existir, facultando as comunicações virtuais, as cirurgias com transplantes de órgãos, a implantação de células-tronco trabalhando pelo milagre da vida, as técnicas de regressão a existências passadas, a convivência com as micropartículas e com a biologia molecular, com o genoma humano decodificado, penetrando-se na intimidade do DNA e nas suas estruturas, O Livro dos Espíritos permanece atual, oferecendo informações de alto significado aos seus pesquisadores.

Resistindo a um século e meio de evolução cultural, filosófica, científica e tecnológica, continua sendo a mais completa síntese de informações contemporâneas de que se tem notícia.

Pelos milhões de vidas que vem iluminando e libertando do suicídio, da loucura, das aflições, tornando-os felizes, todos aqueles que nos deixamos penetrar pela sua sabedoria, cantamos hosanas, saudando-o pelo transcurso do seu sesquicentenário de surgimento em Paris, simbolizando o início da Era Nova do Espírito imortal.



Vianna de Carvalho
Página psicografada pelo médium Divaldo Pereira Franco, no Centro Espírita Caminho da Redenção, no dia 1º de fevereiro de 2007, em Salvador, Bahia.

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