Conta-se que dois irmãos viviam nas regiões do Himalaia. E um deles, depois de algum tempo, resolveu que queria servir a Deus, queria cooperar com Deus, mas não no meio do povo, no meio da massa, no meio da gentalha. Ele queria cooperar com Deus, no Alto do Himalaia, treinando a mente, fazendo exercícios psíquicos. E para lá demandou.
O outro irmão decidiu também cooperar com Deus.
Eu quero servir a Deus. Mas, eu quero servir a Deus aqui, no meio do povo, junto à minha gente. E ficou no vilarejo atendendo às multidões.
O irmão, que subiu a montanha, passou muito tempo lá. Desenvolveu de tal forma a sua capacidade mental, o seu poder de concentração, sua integração com as coisas do Cosmo que, quando pensava algo negativo, ele era capaz de dissolver a neve.
Lá embaixo, o outro irmão trabalhava as necessidades alheias, tratava feridas, as chagas abertas, as dores do mundo.
Mas o irmão que tinha subido a montanha para meditar, sentiu saudade do outro que ficara lá embaixo e decidiu por visitá-lo.
Mas o grande desafio para ele era: Como é que eu vou, depois de tanto trabalho aqui em cima, misturar-me àquela gente lá embaixo? Como é que eu vou?
Mas, a saudade era grande, e ele pensou consigo:
Bem, eu vou fazer uma bola de neve bem compacta e levo comigo porque eu posso verificar como é que vai ficar meu pensamento. Eu poderei sentir se meu pensamento desviar do bem.
Fez a bola de neve e desceu a montanha, silencioso. E quando chegou, depois de muitas horas, lá embaixo, no vilarejo, depois de tanto tempo, saiu a perguntar:
Onde estaria Fulano? O seu irmão. Onde estaria aquele homem?
Alguém apontou um casebre. Algumas folhas de palmeira que cobriam o casebre e debaixo, no meio de jovens, de crianças, de velhos, um homem de barbas longas, a cabeça já alvejada pelo tempo, cuidava da perna de uma jovem morena, muito linda, que esticava-a sobre as pernas dele. Ele tratava de uma ferida aberta, com toda tranquilidade, com toda paz do mundo.
O irmão visitante começou a olhar a jovem que era tratada pelo irmão barbudo.
Foi olhando aquela jovem bela, fixou-se na sua perna esticada e a bola de neve começou a derreter em sua mão.
A moral da história é que é muito fácil ser virtuoso e cooperar com o bem, longe do mal e dos desafios.
O nosso grande repto, o nosso grande desafio na Terra é cooperar com Deus na luta que temos. É cooperar com Deus no meio das adversidades, no meio de toda essa loucura em que estamos, no meio da criminalidade, da corrupção, das mentiras, das falcatruas, das inimizades.
É exatamente para esse meio que Deus nos mandou. E, se o Criador nos mandou pra cá, para viver essa experiência, é porque Ele sabe, é porque Ele soube que aqui, nesse caldo de cultura, é que nós teríamos melhores e maiores chances de crescer, cooperando com o bem na Terra.
Não adianta sermos virtuosos, no meio de virtuosos.
O mundo é de provas, o mundo é de expiações, exatamente porque temos que aprender a tirar leite da pedra, a transformar os limões em limonadas.
É por essa razão que a nossa cooperação com o bem não pode se restringir a viver entre pessoas boas, no sentido de ajudá-las. Não são os bons que precisam de nossa ajuda, como disse o Cristo: Os sãos não precisam de médico, quem precisa de médico é quem é enfermo.
Ainda que tenhamos por amigos do coração as pessoas do bem, as pessoas harmonizadas, as pessoas que nos ajudam a crescer, não esqueçamos que temos um compromisso de estender as mãos àqueles que estão na retaguarda, àqueles que estão atormentados, os que não conseguem entender e ver a vida como nós já conseguimos compreender e ver a vida.
É preciso ser cooperadores do bem, mas onde ele não existe, porque senão, choveremos no molhado.
Seremos como aquele homem que conseguia dissolver a neve com seu pensamento, mas que não tinha dissolvido da alma o olho mau, o olho ruim, o olho lascivo e pecador.
* * *
É desse modo que nós começamos a pensar de que maneira poderemos colaborar com o bem, de que forma poderemos cooperar com o bem no mundo em que estamos.
Parece que a nossa ação não vai servir para nada. O discurso comum é que tudo está perdido, nada tem mais jeito.
Mas, como? Como é que Deus continua mandando crianças para a Terra?
Como é que Deus continua nos dando sol, chuva, primaveras e verões, se não tivesse mais solução para nada?
Por que continua a nos dar sementes para serem semeadas?
É porque as coisas não estão perdidas. Há muita gente perdida na Terra, mas nós poderemos lhes ajudar a encontrar o caminho. Nós poderemos ser-lhes bússola ou apresentar-lhes uma.
Daí nós poderemos colaborar com o bem, cooperar com o bem, enaltecendo os valores das pessoas valorosas.
Como é difícil falarmos coisas boas de quem é bom. Parece que ao falarmos do bem das pessoas boas, nós ficaremos diminuídos, quando não é verdade.
Quando falamos o bem de alguém, a virtude das pessoas que a gente conhece, um vizinho, um colega da escola, um amigo, um professor, um familiar, ou alguém que a gente não conhece, mas que viu na televisão, que leu no jornal, quanta gente boa sobre as quais nós podemos falar coisas boas, ajudando o bem a ganhar espaço no mundo.
Quantas vezes nós podemos dizer a palavra que esclareça, que ilumine, que oriente na hora certa. Ajudar a alguém na hora certa, com uma palavra.
Mas, poderemos cooperar com o bem, silenciando diante da ofensa, da agressão de alguém, por que se nós respondermos naquele impulso da hora, da cólera, da mágoa, com toda certeza nós magoaremos também os outros.
E o grande problema - nos lembrou o Homem de Nazaré - não é o que nos entra de fora para dentro, não é o que nos entra pela boca da alma, é o que sai dela. Porque aquilo que nos chega proveio de alguém e esse alguém será responsável. Mas, o que sai de nós e é negativo, a responsabilidade é nossa.
Então nós poderemos cooperar com o bem, fazendo o bem, falando o bem, ensinando o bem, indicando as coisas boas. Nós temos tantas formas de fazer isto.
O mal não merece comentário em tempo algum. Mas, se houver necessidade de comentarmos o mal de alguém que seja para extrairmos o bem dessa lição.
É nesse pensamento que se apóiam os moralistas, aqueles que ensinam a Humanidade a viver melhor, acompanhando as formas pelas quais a Humanidade vive pior.
Então, cooperar com o bem não é apenas adquirir virtudes em branco, pureza em branco. Aquela pureza teórica de quem se esconde do mundo, de quem se tranca a sete chaves.
A cooperação com o bem, toda a cooperação com o bem exige que nós saiamos ao campo de lutas, ao campo de batalha. É no mundo onde nós deveremos nos desenvolver.
Não esqueçamos da oração sacerdotal de Jesus. Ela foi chamada assim nas traduções - a oração sacerdotal de Jesus, quando Ele pede a Deus em relação aos Seus discípulos:
Senhor, Eu não Te peço que os tires do mundo. Eu Te peço para que os livres do mal.
É no mundo que deveremos estar. A nossa grande preocupação é viver no mundo sem nos tornarmos uma pessoa mundana, negativa, infeliz e inferior. Jamais nivelar por baixo em termos morais.
Nós nos nivelaremos sempre a partir daquilo que é nobre, que é digno, que é bom, cooperando com o bem.
Por isto, vale a pena entender as lições de Paulo de Tarso quando nos propõe falar aquilo que convenha à sã Doutrina; falar aquilo que represente o bem, que seja conveniente ao bem - a Boa Doutrina, a boa orientação do Homem de Nazaré.
Nós podemos cooperar com o bem de múltiplas formas, começando de nós, tratando de nós, gostando de nós próprios, melhorando a nossa autoestima, iluminando o nosso coração para que, de um coração iluminado, possam partir energias positivas na direção dos outros, na direção do mundo.
Foi Cristo que disse que: A boca fala daquilo que está cheio o coração.
Se o nosso ser, se a nossa intimidade estiver cheia de luz, não haverá outro recurso senão falarmos claridades, cooperando com o bem.
por Raul Teixeira, sob coordenação da Federação Espírita do Paraná.
Curitiba, no dia 24 de maio de 2009.
Em 17.12.2020
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