Cumprimentos de Ano Novo
Várias centenas de cartas nos foram dirigidas pelo ano novo, de modo que nos é materialmente impossível responder a uma por uma. Pedimos, pois, aos nossos dignos correspondentes aqui recebam a expressão de nosso agradecimento sincero pelo testemunho de simpatia que tiveram a bondade de nos dar. Entre elas uma, por sua natureza, exige uma resposta especial: é a dos Espíritas de Lyon, subscrita por cerca de duzentas assinaturas. Aproveitamos a circunstância para transmitir, a seu pedido, alguns conselhos gerais. A Sociedade Espírita de Paris, fundada por nós, julgando que podia ser útil a todo o mundo, não só nos convidou a publicar a Revista, mas votou a sua impressão separada para ser distribuída a todos os seus sócios. Todos aqueles que tiveram a gentileza de nos escrever participam dos sentimentos de reciprocidade que aí exprimimos e que se dirigem, sem exceção, a todos os Espíritas franceses e estrangeiros, que nos honram com o título de seu chefe e de seu guia na nova via que se lhes abre. Não só nos dirigimos aos que nos escreveram, pela passagem do ano novo, mas a todos os que, a cada momento, nos dão tocantes provas de seu reconhecimento pela felicidade e pelas consolações que encontram na doutrina e que nos relatam as suas penas e os seus esforços para ajudar a sua propagação; a todos, enfim, aos quais nossos trabalhos servem para algo na marcha progressiva do Espiritismo. 

Resposta à Mensagem de Ano Novo dos Espíritas Lioneses

Meus caros irmãos e amigos de Lyon.

A mensagem coletiva que tivestes a bondade de me enviar pela passagem do ano novo causou-me viva satisfação, provando que conservais de mim uma boa recordação. Mas o que me deu maior prazer em vosso ato espontâneo foi o de encontrar entre as numerosas assinaturas representação de quase todos os grupos, pois é um sinal de harmonia reinante entre eles. (...)

Agradeço-vos, meus bons amigos, os votos que me formulais: eles me são tanto mais agradáveis quanto sei que partem do coração - e são os que Deus escuta. Ficai satisfeitos porque Ele os exalça diariamente, dando-me a alegria inaudita no estabelecimento de uma nova doutrina, de ver aquela a que me devotei crescer e prosperar, em meus dias, com rapidez maravilhosa. Encaro como um grande favor do céu o ser testemunha do bem que ela já faz. Essa certeza, da qual diariamente recebo os mais tocantes testemunhos, me paga com usura todas as penas e fadigas. Só uma graça peço a Deus: a de me dar a força física necessária para ir até o fim de minha tarefa, que está longe de ser terminada. Mas, haja o que houver, terei sempre a consolação da certeza de que a semente das ideias novas, agora espalhada por toda a parte, é imperecível. Mais feliz que muitos outros, que não trabalharam senão para o futuro, a mim me é dado ver os primeiros frutos. Se algo lamento, é que a exiguidade de meus recursos pessoais não me permita pôr em execução os planos que tracei para seu mais rápido desenvolvimento. Se, porém, em Sua sabedoria, Deus o quis de outro modo, legarei este plano aos meus sucessores que, sem dúvida, serão mais felizes. (...) Recebei nossas felicitações pela maneira pela qual sabeis compreender e praticar a doutrina. Sei como são grandes as provas que muitos de vós tendes de suportar. Só Deus lhes conhece o termo aqui na Terra. Mas, também, quanta força contra a adversidade nos dá a fé no futuro! (...)

Pedis que continue com os meus conselhos. (...) Por isso aproveito a circunstância para vos dirigir algumas palavras que vos provarão que, de perto ou de longe, sou todo vosso. (...)

A tática ora em ação pelos inimigos dos Espíritas, mas que vai ser empregada com novo ardor é a de tentar dividi-los, criando sistemas divergentes e suscitando entre eles a desconfiança e a inveja. Não vos deixeis cair na armadilha; e tende certeza de que quem quer que procure, seja por que meio for, romper a boa harmonia, não pode ter boas intenções. (...)

A natureza dos trabalhos espíritas exige calma e recolhimento. Ora isto não é possível se somos distraídos pelas discussões e pela expressão de sentimentos malévolos. Se houver fraternidade não haverá sentimentos malévolos; (...)

(...) Em vossas reuniões afastai cuidadosamente tudo quanto se refere à política e às questões irritantes. A tal respeito as discussões apenas suscitarão embaraços, enquanto ninguém terá nada a objetar à moral, quando esta for boa. Procurai no Espiritismo aquilo que vos pode melhorar. Eis o essencial. Quando os homens forem melhores, as reformas sociais realmente úteis serão uma consequência natural.  (...)

Eis, meus amigos, os conselhos que vos dou e aos quais junto os meus votos para o ano que começa. Não sei que provas Deus nos destina este ano; mas sei que, sejam quais forem, as suportareis com firmeza e resignação, pois sabeis que para vós, como para o soldado, a recompensa é proporcional à coragem.

Quanto ao Espiritismo, pelo qual vos interessais mais que por vós mesmos, e cujo progresso, pela minha posição, posso julgar melhor que ninguém, sinto-me feliz ao vos dizer que no ano que se inicia, sem dúvida ele verá crescer o número dos adeptos numa proporção imprevisível. Mais alguns anos como estes que se passaram e o Espiritismo terá a seu favor três quartas partes da população. (...)

Num departamento vizinho de Paris [Chauny, Aisne] há uma cidadezinha onde o Espiritismo penetrou apenas há seis meses. (...) Conta uma população operária numerosa, em cujo meio as ideias espíritas, (...), aumentam dia a dia. Ora, um fato digno de nota é que as mulheres e as moças esperaram o ano novo para comprar as obras necessárias à sua instrução e só para essa cidade um livreiro teve que as remeter às centenas. (...) Novos filhos na grande família, eles vos saúdam, irmãos de Lyon, como seus irmãos maiores, e desde já formam um dos elos da cadeia espiritual que une Paris, Lyon, Metz, Sens, Bordeaux e outras, e que em breve ligarão todas as cidades do mundo num sentimento de mútua confraternidade: porque em toda a parte o Espiritismo lançou sementes fecundas e seus filhos se dão as mãos por cima das barreiras dos preconceitos de seitas, castas e nacionalidades.

Vosso dedicado irmão e amigo

Allan Kardec


1. KARDEC, Allan. Revista Espírita: Jornal de Estudos Psicológicos. São Paulo: EDICEL, 1966. dez. 1862, v. 2.

© Federação Espírita do Paraná - 20/11/2014