Lycurgo Negrão

Militar, poeta, espírita e maçon, Lycurgo Negrão nasceu na cidade de Morretes, no litoral paranaense, em 16 de maio de 1916.

 

Filho de Pedro Negrão e Maria Augusta Scarpin Negrão, iniciou seus estudos no Grupo Escolar Miguel Schleder em sua cidade natal, onde cursou o ensino primário. Posteriormente, durante o ano de 1930, sua família transferiu-se para a cidade de Ponta Grossa, e Lycurgo foi matriculado no Liceu dos Campos, dirigido pela professora Judith Silveira. Nesse educandário, Negrão fez o curso preparatório para o exame de admissão ao ginásio, vindo a ingressar no então Ginásio Regente Feijó, hoje Colégio Estadual. Ali cursou o primeiro ano ginasial e, em 1932, com a transferência de sua família para Curitiba, foi matriculado no Ginásio Paranaense.

 

Convocado para o serviço militar em 1938, foi incorporado à 1ª Companhia de Transmissões na Guarnição Militar de Curitiba e, decidido a permanecer no Exército Brasileiro, seguiu a carreira militar, galgando as graduações de Sargento e Subtenente da arma de Engenharia, chegando ao posto de 1º Tenente. Serviu no 2º Batalhão Ferroviário, sediado na cidade de Rio Negro, no Paraná, no 1º Batalhão de Engenharia, na Vila Militar, no Rio de Janeiro, no 7º Batalhão de Engenharia em Petrolina - Pernambuco, e na Comissão de Estradas de Rodagem CER/1, em Ponta Grossa, para onde foi transferido em 1948, permanecendo nessa unidade militar até sua transferência para a Reserva Remunerada do Exército em 1963.

 

Embora nascido em família católica, conheceu a doutrina codificada por Allan Kardec, tornando-se espírita, e em 1949 ingressou na Sociedade Espírita Francisco de Assis de Amparo aos Necessitados, onde foi vice-presidente do Departamento de Juventude, hoje União da Mocidade Espírita Cristã - UMEC - e diretor do jornal Voz da Espiritualidade, periódico de divulgação doutrinária que tinha publicações mensais ao encargo dos jovens participantes da Mocidade Espírita, e que ao longo de sua trajetória contou com a colaboração de renomados espíritas como Guaracy Paraná Vieira, Vitor Ribas Carneiro, Ricardo Engel, João Hadad, Ari Schmidt, entre outros.

 

No Movimento Espírita de Ponta Grossa, Lycurgo Negrão teve papel de destaque, atuando em diversos setores, sempre visando ao bem-estar do próximo e à prática da caridade. Foi vice-presidente da Sociedade Espírita Francisco de Assis de Amparo aos Necessitados, diretor do Albergue Noturno Álvaro Holzmann, diretor da Livraria Espírita A Educadora e coordenador de assistência espiritual no Lar Hercília Vasconcellos.

 

Sua ação no movimento espírita não se limitou apenas às atividades desenvolvidas na Sociedade Espírita Francisco de Assis, e suas preocupações com a infância desamparada levaram-no a fundar em janeiro de 1957 a Mansão Bezerra de Menezes, com o objetivo de abrigar e educar meninos órfãos dentro dos princípios do Espiritismo Cristão, contando com a participação e apoio de outros confrades como João Haddad, Guaracy Paraná Vieira, Célia Madalosso Vieira, Alexandre Sech, Joanino Sabatella, Nara Sabatella, Iolanda Sabatella, Ondina Nunes Borges, Ary Schmidt, Francisca Meira Wambier, Hugo Borges Marçal, Arthur Correa de Freitas, Álvaro Borges, Moacyr Mourão Araújo, Neuza da Cunha Ajuz,  Zilah Grácia Araujo, Ubirajara Sabatella, Jorge Miguel Ajuz, Waldemar Wambier e João Cecy. Esse trabalho idealizado por Lycurgo Negrão foi incentivado por dois espíritas renomados: Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco.

 

Sempre preocupado com os problemas sociais, auxiliou das mais diversas formas os desvalidos da sorte, seja através da compra de medicamentos, do auxílio financeiro e até mesmo patrocinando funerais, dando dignidade a todas as pessoas mesmo na hora extrema em que deixavam a vida física, proporcionando-lhes um funeral digno. Para que isso fosse possível, manteve um crédito com uma funerária, onde comprava os esquifes, pagando esses caixões em prestações mensais.

 

Mobilizou os jovens da União da Mocidade Espírita Cristã no final da década de 1950, criando a Escola Espírita Alvorada Nova onde era ministrada evangelização nas tardes de sábado em uma favela na região do Olho d´Água São João de Maria. Para aquele local era levada sopa feita na Mansão Bezerra de Menezes e distribuída para todas as pessoas necessitadas, ao mesmo tempo em que se realizava visitação aos barracos com a leitura do Evangelho. Ali Lycurgo Negrão fundou mais tarde a Casa Transitória Fabiana de Jesus.

 

Dentre os pioneiros dessa instituição benemérita destacam-se Gustavo Biscaia, Ney Paulo de Meira Albach, Newton de Meira Albach, Telmo Luiz Meira Wambier, Danilo Santos, Leny Wachtler, Tamir Bárbara Alves, Célio Costa, Tacir Teixeira Alves, Gaspar Correa, Thereza Moreno, Orlando Marcelino da Silva, Francisco Seviatowski, Estácio Rodrigues da Cunha, João Haddad, Helena Jarmulinski, Maria Augusta Scarpim Negrão, Alice Mayer, Elisário Camargo de Mello e Álvaro Holzmann.

 

A Casa Transitória Fabiana de Jesus passou a promover o crescimento pessoal de seus assistidos organizando diversos departamentos como o Clube de Mães implantado por Cely Costa Ribeiro, inicialmente com reuniões aos sábados e que posteriormente passaram a ser realizadas às quintas feiras, e ainda o atendimento às gestantes, o Clube de Meninas onde jovens a partir de 12 anos aprendiam trabalhos manuais, artesanato e participavam de atividades esportivas voltadas a uma formação cidadã.

 

Em 1963, preocupado em proporcionar para jovens carentes uma formação profissional na área agrícola, adquiriu vinte e dois alqueires de terra no distrito de Guaragi, onde fundou uma Granja Escola denominada Cantão Pestalozzi. Essa instituição tornou-se mais tarde a Fundação Educacional Pestalozzi atendendo às necessidades da população daquele distrito. Lycurgo Negrão contou inicialmente com o apoio de Serena Coutinho de Oliveira, Loiva Fraga, Maria Tereza Penteado, Daltro Moro, Levi Martins, Maria Elizabet Kruger, sendo que, posteriormente, outros colaboradores vieram somar esforços nessa empreitada.

 

Em 18 de abril de 1964, Lycurgo Negrão criou o Liceu Pestalozziano de Evangelização Espírita, destinado ao estudo sistematizado da Doutrina Espírita, onde iniciaram-se atividades com o objetivo de atender ao crescente número de crianças que vinham acompanhadas de suas mães assistir às preleções doutrinárias. Dessa forma deu-se início a um trabalho que perduraria por muitos anos atendendo à comunidade de Guaragi de maneira fraterna a todas as pessoas que buscavam ali orientação e auxílio.

 

No ano de 1967, naquele mesmo local, Lycurgo Negrão juntamente com Felipe Chade, Ataulfo Colino, Edwiges Doná Dantas e Serena Coutinho de Oliveira criou a Fundação Educacional Pestalozzi com o objetivo de propugnar pela formação moral, cívica, cultural e religiosa da família, especialmente da infância e juventude desvalida, educando-as sob as luzes do espiritismo.

 

Juntamente com o Tenente Estácio Rodrigues da Cunha, Lycurgo Negrão participou ativamente do Núcleo da Cruzada dos Militares Espíritas de Ponta Grossa, onde foi diretor do Departamento Vianna de Carvalho. Participou também da fundação do Quartel Juvenil Paulo de Tarso, que atendia meninos órfãos ou cujos pais não tinham condições para criá-los e, durante os anos em que funcionou como instituição para abrigo e proteção a crianças, teve em média vinte e quatro meninos, amparados pela instituição.

 

Negrão teve, também, ação destacada no cargo de Diretor do Departamento de Serviço Social na Secretaria Municipal de Saúde e Bem-Estar Social, durante a gestão do prefeito Luiz Carlos Zuk, que tinha como secretário daquela pasta Carlos Osternack Postiglione. Frente àquele departamento, Lycurgo Negrão buscou organizar o cadastro de entidades assistenciais do município. Promoveu ainda um curso prático de emprego da soja na alimentação popular. Participou, efetivamente, da criação do Conselho Municipal de Assistência ao Menor.

 

O reconhecimento de seu trabalho pelo poder público fez com que fosse agraciado com o título de Cidadão Honorário de Ponta Grossa em 1989, através da Lei municipal 4324/89, de autoria do então vereador Péricles de Holleben Mello, sancionada pelo prefeito Pedro Wosgrau Filho. Também foi homenageado em sua cidade natal com o título de Morretense Emérito, através da Lei Municipal 972/91, de 25 de outubro de 1991, de autoria do vereador Dejair Miranda, então presidente da Câmara Municipal de Morretes.

 

Como intelectual e poeta, Lycurgo Negrão utilizou-se do pseudônimo Porthus Mariani, com o qual assinava seus poemas e textos. Foi membro da Academia de Letras dos Campos Gerais, ocupando a cadeira  nº 2, da qual foi fundador, e que tem como patrono Adejaniro Cardon. Participou com seus textos das publicações das Antologias, produzindo poemas que ressaltam sua terra natal, Morretes, e o litoral paranaense, bem como Ponta Grossa e Guaragi. Entre sua produção literária encontramos presente a preocupação com as crianças desamparadas, conforme observamos no poema intitulado Menino de rua.

 

Menino de rua,

Que contradição...

Você tão sozinho

Perdido no meio

Da multidão.

 

Sem ter quem eduque,

Sem ter instrução.

Sem eira nem beira,

Ao léu, sem destino,

Meu Deus que aflição.

 

Você tem amigos,

Tem pais, tem irmãos?

Alguém da família,

Tutor ou padrinho,

Se tem, onde estão?

 

Sem lar, sem família,

que desolação.

Você vai crescendo

Com tantos perigos

Sem ter proteção.

 

Porém, Jesus é socorro

Menino ruão,

É lar é família,

Tutor e padrinho,

Altruísta irmão.

 

É muito auxílio,

É muito amor.

Mas, que situação...

Prá tanto socorro

Tem pouco cristão.

 

Foi sócio do Centro Cultural Euclides da Cunha, tesoureiro da Casa do Poeta de Ponta Grossa e da União Brasileira dos Trovadores, seção Ponta Grossa.

 

Lycurgo Negrão foi ainda maçom, vinculado à Loja Maçônica Amor e Caridade nº 582, do Grande Oriente do Brasil, na qual foi admitido em 4 de agosto de 1965 e iniciado em 18 de dezembro do mesmo ano.

 

A Loja Maçônica Amor e Caridade, foi fundada em Ponta Grossa no ano de 1897. A participação de Lycurgo Negrão, nessa instituição, reflete os ideais que lhe nortearam a vida e que são perfeitamente consonantes com o ideal maçônico, pois a Maçonaria tem entre seus princípios fundamentais a preocupação com a igualdade, a liberdade, a fraternidade, a solidariedade e a tolerância entre os homens, conforme afirma o historiador Orlando Antonio Cestaro.

 

Nessa instituição galgou os diversos graus chegando a Mestre Maçon em 7 de junho de 1967. Ocupou os cargos de secretário em 1968 e 2º vice-presidente em 1969, além de outros cargos, durante seus mais de quarenta anos de serviços prestados à maçonaria. Galgou todos os graus filosóficos chegando à plenitude no grau 33. Apresentou vários trabalhos e recebeu o título da Cruz da Perfeição Maçônica.

 

Lycurgo Negrão desencarnou em Ponta Grossa no dia 29 de dezembro de 2012, sendo sepultado no dia 30, no cemitério Água Verde, em Curitiba.

 

 Fábio Maurício Holzmann Maia - Diretor Setor de Pesquisa e História do Espiritismo nos Campos Gerais/ União Regional Espírita 2ª região


Fontes de consulta:
Acervo da Câmara Municipal de Ponta Grossa
Acervo da Fundação Educacional Pestalozzi
Acervo da Loja Maçônica Amor e Caridade
Academia de Letras dos Campos Gerais. Antologia. Ponta Grossa: Academia de Letras dos Campos Gerais, 2012.
CESTARO, Orlando Antonio. Maçonaria em Ponta Grossa: Fraternidade e Sociedade. In: CHAVES, Niltonci Batista (Org.) Visões de Ponta Grossa: cidade e instituições. Ponta Grossa: UEPG, 2004.
MAIA, Fábio Maurício Holzmann. Os Trabalhadores da Primeira Hora. Curitiba: Federação Espírita do Paraná, 2011.

Em 16.12.2013.

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