Carta de Allan Kardec, enviada de Sainte-Adresse, para onde se retirara a fim de trabalhar na obra O Evangelho segundo o Espiritismo, à sua esposa Amélie Boudet, que ficara em Paris.
Sainte-Adresse, 11 de setembro de 1863.
Minha cara Amélie,
Recebi ontem tua carta, que me deu tanto maior prazer porque a esperava com impaciência, surpreendendo-me por não tê-la recebido mais cedo. Vejo com satisfação que tudo vai bem. Quanto a mim, como disse, a uniformidade de minha vida não dá margem a nenhum incidente digno de ser contado.
Limito-me, pois, a dizer-te que estou bem de saúde, melhor até que no início de minha estada aqui. Não é senão com o passar do tempo que a influência da mudança do ar se faz sentir; no começo se sofre um pouco.
Há dois dias somente que o tempo ficou bom, porque tivemos grandes tempestades.
Almocei uma vez na casa da Sra. Foulon, e quarta-feira à tarde, voltando ali novamente, aquelas senhoras fizeram questão de me reterem para o jantar. A Sra. Lombard preparou-me uma torta de ameixas deliciosa. Não as revi desde tua carta e não lhes pude anunciar o incidente que sobreveio às duas pequenas cozinheiras.
Quando me escreveres, dize-me se sabes o nome daquela senhora de Bourg que para aqui veio. Fico encantado de ver, finalmente, um gérmen da Doutrina nesta região.
Diz ao Sr. D´Ambel que fui tomado pelo pesar muito natural que ele experimentou; entretanto, penso que, como verdadeiro espírita que é, ele saberá suportar tudo isso com resignação.
Domingo passado fiz uma excursão aos faróis, onde houve uma borrasca seguida de bom tempo. Almocei no restaurante. Tem uma vista maravilhosa (...)
[...] Adeus, cara Amélie; o tempo de meu retiro chega ao fim e logo poderei te abraçar.
Todo teu.
[assinado] A.K.
Não me esqueças junto de ninguém.
Nesta carta, Kardec menciona o efeito benéfico da mudança de ar, o que leva a pensar que seu retiro era motivado também por um problema de saúde, além do isolamento para a redação do Evangelho. O Sr. D´Ambel, médium da Sociedade de Paris, que na época era seu secretário, aparentemente havia perdido um ente querido. É de notar, também, a breve menção de uma senhora de Bourg, deduzindo-se que Kardec era ligado àquela região, na qual havia passado sua infância [Bourg-en-Bresse, perto de Lyon, onde nascera].
O Evangelho segundo o Espiritismo, de Charles Kempf (Revista Reformador)
Em 28.7.2014.
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